sexta-feira, 24 de agosto de 2012

O que é o tempo

Passo os dedos por entre os cabelos e cada movimento é antecedido por um sentimento de espera. Não que isso seja proposital, mas a essência do gesto carrega em si uma tranquilidade aparente, um certo conforto. O telefone toca e o gesto é descontinuado, dando-me a sensação de que por instantes, o tempo havia parado. Aí percebo que o tempo não é um receptáculo de instantes, não é a distância entre um presente, um passado, um futuro. É o movimento interno dos entes para reunirem-se consigo mesmos e para diferenciarem-se de si mesmos. Não estou no tempo mas sou temporal, porque o tempo é a produção do sentido e dos seus significados.O corpo tem lembranças: cheiros, toques, mudanças.O corpo tem como base a temporalidade. Quando vivencio o meu presente, ele se apresenta em uma situação na qual sinto, faço, penso. Quanto ao meu passado, percebo que as possibilidades existiam. Algumas se concretizaram, outras não. No presente sou capaz de perceber novas possibilidades. Aqui, há uma abertura. O meu futuro poderá ser se as possibilidades presentes se concretizarem. Quem pode controlar as diferentes formas de sentir? O que é o tempo senão o significado do que é vivenciado? Nossos tempos são diferentes porque somos singulares. Portanto, o bom senso é necessário quando se trata de dispor do tempo do outro. Alguns são velozes, outros muito lentos. Cada um no seu compasso.

domingo, 19 de agosto de 2012

Eu e os Outros

Morar dentro de nós e buscar-nos nos outros que estão fora, é uma tarefa  que exige loucura e lucidez ao mesmo tempo. Loucura porque muitas vezes é preciso romper com tudo que se é, para compreender o outro. Lucidez porque ao voltar , a visão do que foi deixado na partida de encontro com o outro torná-se confusa e nem sempre agradável. Algumas certezas sofrem abalos, algumas incertezas tomam um rumo inesperado, dando-nos a impressão de que não mais existimos e que teria sido melhor uma clausura permanente. Aí olhamos bem pra dentro de nós e começamos a nos reconhecer no que fora estava. Fazemos um passeio pela nossa história e várias faces vão surgindo. Aos poucos vamos nos recompondo e aliviando as perdas iniciais quando resolvemos morar , mesmo que por pouco tempo fora de nós. As surpresas continuam, quando nos reconhecemos mais e mais nos outros. Esse reconhecimento muitas vezes está nas diferenças e não nas semelhanças. O outro nos recria, nos faz nascer de novo.O sujeito não está mais centrado no "Eu penso", nem no Ser, nem na dúvida, mas descentrado pela alteridade do outro. Não se trata mais de uma questão de "Eu penso, logo existo", mas sim eu existo no outro e o outro existe em mim.E essa existência nos indica o caminho da responsabilidade na construção de uma vida onde se possa compartilhar forças e fragilidades, encantos e desencantos. Diferentes pontos e diferentes linhas devem nos permitir morar dentro de nós mesmos, e sair vez por outra, não nos tornando reféns, já que morar em nós mesmos, deve nos permitir um sentimento de liberdade e prazer. 

domingo, 12 de agosto de 2012

Ser pai

Ser pai não é tarefa fácil, ainda  mais quando se é pai e mãe ao mesmo tempo. É tarefa que exige decisão, empenho com o que a vida nos apresenta. Não é uma questão de gênero, mas de amor. Não é uma questão de saber como caminhar, mas de muitas vezes ser o próprio caminho.É se perceber no filho e deixar que ele se perceba em você. É adiar compromissos que pareciam ser inadiáveis e fomentar competências cotidianas. A construção é muitas vezes lenta, outras vezes acelerada, dependendo do pai que se quer ser. É preciso porém , que a intensidade do que é vivido tenha o significado de humanidade. A descoberta é feita dia após dia, numa incansável vontade de acerto. Não existe uma verdade pronta, absoluta, assim como é a vida; constituída por dores e prazeres, erros e acertos, noites e dias. O importante é que o nosso desejo paterno descubra o equilíbrio necessário para as perguntas que nos são feitas. Essas perguntas se modificam com o tempo e as nossas respostas muitas vezes precisam ser revistas considerando-se a faixa etária do nosso filho e  as mudanças sociais. Não podemos desconhecer que somos seres históricos, que a realidade é processual, dando-nos a impressão de instabilidade.É bom entendermos que existem questões que fundamentam esse processo, facilitando a superação de algumas angústias no decorrer dessa caminhada. É necessário encontrarmos um ponto de estabilidade na relação. Relação que deve ser baseada em valores éticos, em amor, propiciando dessa forma um elo de fortalecimento, que impeça o rompimento da relação em momentos de crise. Enfim , ser pai é entender que o filho vive em nós e fora de nós, e que essa vivência se faz mais saudável quando existe amor, respeito pelos distintos silêncios, busca por um constante diálogo e insistência em um infinito amor. 

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Por quanto tempo?

Quantas vezes me procurei olhando para o passado, tentando entender o presente, projetando-me para o futuro. Quantas vezes me perdi, outras vezes me achei: vezes tristes, algumas felizes e outras sem definição. Quantas vezes foi possível buscar-me em desejos ocultos, solitários, abandonados. Quanto tempo fiquei inerte? Quanto tempo passei esquecida de mim mesma? Onde foram parar aqueles sonhos combinados a uma certa realidade, construída de juventude, beleza, prazer? É como se eu pudesse ter todos os relógios esperando por mim. Algumas coisas porém, me fazem perceber o passar do tempo: não são as pequenas mudanças ocorridas no corpo. É um peso que me deixa apática, é uma falta de sorrisos fáceis, é um torpor  que me envolve a alma como se eu estivesse anestesiada. É essa rotina, essa falta de novidades. Essas obrigações que me são impostas e que não me deixam alternativas. É o corre corre dessa vida louca. É você que na verdade espero, mas não sei de onde virá.

Texto produzido em 2002

Existência

Sempre pedem muito daquilo que não somos
Sempre dispensam muito daquilo que somos
Não somos o que nos é pedido,
Muito menos deixamos de ser o que nos é dispensado.
Somos qualquer coisa ou coisa nenhuma
Iguais nas nossas diferenças
Igualmente diferentes em diferentes faces.
Por isso não cobrem o que em mim não existe
Não queiram fazer-me segundo suas aspirações ideológicas
Deixem-me ser, e já fazem assim muito por mim.

domingo, 5 de agosto de 2012

Um pouco de Freud

Hoje me ergo e me nego;
Há uma constante briga entre o id, o ego e o super-ego.
Quem dera eu achasse um jeito de ir até o inconsciente,
E no divã dessa vida perceber o sol nascente.
Isso sim me assombra e deslumbra; saber que o sol nascente
Não passa de uma penumbra.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

O que nos faz humanos?

Ando pensando muito sobre o que de fato move o homem. O que nos torna tão diferentes e ao mesmo tempo tão próximos dos irracionais. É fácil compreender alguns conceitos quando bem elaborados, reconhecidos pelo meio acadêmico, e aceito até por algumas pessoas que de tão primitivas se diziam incapazes de compreender ou fazer algum tipo de abstração.Não estou aqui menosprezando as pessoas que conservam em si uma certa originalidade, muito pelo contrário, estou reconhecendo a força de alguns conceitos que de tanto tratados, terminam por nos "engessar" de forma irremediável. Para Sartre, um dos mais populares representantes do existencialismo francês, só o ser humano é um "ser -para-si", aberto à possibilidade de construir ele próprio sua existência, enquanto os animais são em "em-si", por não serem capazes de se colocar "do lado de fora" para se auto-examinarem. Os animais são o que são, têm uma essência, enquanto no ser humano "a existência precede a essência". Ou seja: somos o que fazemos. Somos o que vivenciamos, somos os únicos capazes de irmos adiante, planejarmos o futuro, pensarmos inclusive na morte.Mas porque será que ao fechar os olhos e lembrar do meu cachorro, mesmo sendo cientista social e considerando questões que são próprias do homem, tenho a sensação de que aquele olhar me via, enquanto outros tantos humanos não me veem. Aquela corrida ao meu redor quando eu chegava em casa me dizia muito mais que algumas falas perdidas, sem sentido. Aquele olhar amistoso e leal me fazia muitas vezes encontrar meu lugar no mundo. Quero deixar claro que esses questionamentos são importantes para que eu possa situar a minha subjetividade e para que eu possa perceber que a consciência da existência abre caminhos de reflexão que desnaturalizam o lugar de seres considerados sem importância, mas que nos fazem  compreender o sentido de um aconchego.